31.5.09

Uns tropeços pelo caminho

Após visitar o "Elo Perdido" de Yavisa, voltamos pela panamericana até Torti – uma outra vila no caminho.
Dormimos por lá num hotelzinho “1/2 estrela” (ou seria 1/4 ?).
No dia seguinte, 23/5, acordamos numa bela manhã ensolarada.
Rapidamente, arrumamos a Dedete e pegamos a estrada.
Agora, nosso destino seria Carti na costa do atlântico, onde o veleiro que escolhemos estava ancorado, nos esperando.

Voltamos um pouco mais pela panamericana até El Llano e encontramos uma estradinha de terra.
Na dúvida, perguntamos a um rapaz se aquela era mesmo a estrada que seguia até Carti.
Confirmada a rota, logo no primeiro quilômetro, pegamos uma subida daquelas, bem íngreme e cheia de pedras.
Ficamos um pouco tensos, porém superamos esta.
Mal sabíamos o que estava nos esperando pela frente.

A estradinha até que melhorou um pouco nos quilômetros seguintes.
Aproveitamos para curtir o visual.
Estávamos iniciando a travessia da Cordilheira de San Blas, que separa o centro do Panamá e o Atlântico.
Trata-se de Território dos indios Kuna, totalmente autônomo.
O Panamá não tem qualquer influência na administração desse território.

À medida que subíamos a cordilheira, a estrada ia piorando.
Era muita pedra, o que dificultava o controle da moto. Além disso, chove muito nessa região. Então, onde não havia pedra, havia lama.
Fui tocando lentamente.

Num certo momento, não sei porque, parei a moto e falei para a Paula guardar a filmadora - ela vinha filmando todo o caminho.
Aproveitei e guardei o Almada (nosso GPS), sem desligá-lo - não ia perder a oportunidade de registrar essa travessia raramente efetuada por motociclistas.
Tiramos umas fotos e contemplamos aquela paisagem - uma mistura de mata fechada e vales - algo que nunca tínhamos atravessado de moto.
Começamos a ficar preocupados.
Pouco conversávamos, sem querer botar medo um no outro.
Estava óbvio que aquela travessia não seria nada fácil.

Uns dias antes, quando fui informado que o veleiro estava em Carti, tentei buscar informações sobre a situação da estrada através dos meus amigos do Portal ADV Rider.
Eu não tinha conseguido nenhum relato na internet de alguém que tenha escolhido esse caminho para atingir o Atlântico - não de moto.
Um amigo meu, americano e panamenho, que tem me ajudado bastante, me mandou um email dizendo que "dava para passar", mas que também não sabia de alguém que tivesse feito essa passagem de moto e, principalmente, com alguém na garupa. Mas, também me disse que o caminho era lindo e valia a pena o esforço.
Naquela altura do caminho, achamos melhor ir seguindo com cautela.
Ainda me lembro dizer para a Paula antes de prosseguirmos :
- Nós vamos bem devagar, tá. Isso não vai ser fácil.

Logo na próxima descida mais íngreme, veio a primeira surpresa:
A Dedete perdeu a aderência nas pedras e não deu para segurar...........fomos, os três, beijar o chão.
Ainda deitado , me virei para ver a Paula. Foi um alívio vê-la deitada me fazendo sinal de positivo.
Por incrível que pareça, calmamente, nos levantamos, demos uma risadinha e começamos a retirar as malas para poder levantar a coitada da Dedete, que ainda permanecia deitada.
Por sorte, uma perua parou com 4 pessoas. Eram ingleses que estavam explorando a região. Nos ajudaram a levantar a moto.
Refeitos do susto, aproveitei para questionar se conheciam a estrada.
Dois deles disseram que, “aparentemente”, estava boa. Era só ir seguindo devagar.
E devagar seguimos por 2 horas sobre lama e pedras soltas.

Resumo : mais dois “beijos no chão”. Tudo devagar, seguindo o mesmo ritual. Verificar se o outro estava bem, risadinha sem-graça, levantar a moto e seguir.
Estávamos bem cansados, sujos e ensopados de suor no meio daquela mata fechada.

A próxima surpresa foi sermos parados por índios Kuna que estavam cobrando pedágio por passarmos pela reserva – US$ 2 por pessoa mais US$ 3 pela moto. Tudo calculado na hora, na base do improviso.
Hummmmm…….naquela situação, cheios de lama, o melhor era pagar e seguir.
Novamente, questionei o estado da estrada e, novamente, fui informado que estava “boa”.
Só achei estranho quando o índio me disse em espanhol :
-      Tem um rio pequeno. Mas, acho que está seco.
Bem, não havia muito mais o que fazer, a não ser seguir vagarosamente.

Um pouco mais a frente, o “rio seco” surgiu à nossa frente.
Até onde sei, aquilo era muita água com correnteza.
Ficamos paralizados.
Só faltavam uns 2 KMs até o aeroporto de Carti - nosso destino. E estávamos exaustos.
Sentamos na beira do rio e começamos a pensar no que fazer. Até que dois jipes 4X4 chegaram. Eles também iam atravessar o rio.
Conversamos um pouco sobre onde seria o melhor lugar para cruzar. Um rapaz entrou no rio até o meio para ver a profundidade. Parecia que dava. Decidimos que uma perua iria na frente, eu viria na sequência na Dedete e a outra perua viria logo em seguida, “só pra garantir” se algo acontecesse.
Decidimos também que a Paula iria na primeira perua. Ela fez uma carinha de desgosto. Mas, naquela altura da viagem, o melhor era facilitar ao máximo a dirigibilidade da Dedete. As malas também foram colocadas na perua.

Confesso que tive medo. Acho que nunca me concentrei tanto numa atividade (vide fotos).
Fui entrando no rio com a Dedete, me esforçando para mantê-la em movimento, enquando seguia o traçado da primeira perua. Senti o frio da água entrando nas minhas botas e subindo pela perna. A Dedete foi seguindo firme no meio da correnteza. Passou pela metade, começou a ficar mais raso, até que atingimos a outra margem.
De dentro da perua, a Paula me fazia sinal de força e sorria.

Aquele evento inesperado acabou nos dando força para seguirmos o que faltava da estrada, ainda com muita lama, água e pedras.
Fui seguindo a perua até que, de repente, ela fez uma curva para a direita e entrou numa estrada asfaltada.
Não entendi nada.
Asfalto no meio da selva ?

Pronto. Chegamos !!!!
Estava motorando em plena pista do tal aeroporto de Carti.
Um pedacinho de asfalto no meio da mata.
O aeroporto é uma mistura de pista, vila e marina – fica já no mar.

No “terminal do aeroporto” (vide fotos), já tinham várias pessoas locais (Kunas) nos aguardando para colocar a moto na “lancha” (vide fotos) para chegarmos até o veleiro.
E lá fomos nós em mais essa………
Moto na “lancha, seguimos até o veleiro que nos aguardava calmamente em uma outra baía.
O processo de subida da moto no veleiro foi até bem simples. Utilizamos os cabos (adriça) da vela mestra.
Em poucos minutos, a Dedete já conhecia sua nova garagem para os próximos dias.
E assim, depois de uma noite de descanso, zarpamos para conhecer as ilhas e aldeias Kuna no arquipelago de San Blas.

9 comments:

  1. Paulo Almada1/6/09 10:26 AM

    Meninos!!! Quase perdi o fôlego ao ler o relato desse trecho. Esqueci de respirar! Ainda bem que apareceram os outros companheiros na horinha, hein? Levantar a Dedete, dar cobertura para a travessia do riacho, etc e tal! Caramba! Parece até ficção! Mas, não deixa de ser um sinal de que vcs estão sendo protegidos pelo Pai e pela força dessa galera que está acompanhando vcs. Um hurra por mais esse trecho vencido!
    Beijão do Papi.

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  2. Uffa!!!! não sei não, mais acho que o pior já passou (rs) o que vc penssou qdo atravessou o riu, se a dedete cair aqui já era...ela vai se afogar e nuca mais saio daqui!!! não eh verdade?
    Boa sorte! Marcão.

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  3. Boa tarde Lucio e Paula, saudações gaudérias,

    Que maravilha de viagem/aventura! Já havia lido a entrevista do Rock Riders e achei muito legal e interessante. Parabéns!
    Como motociclista que gosta de aventura e de estrada fico feliz por vcs estarem nos presenteando com seus relatos e fotos, compartilando conosco esses momentos de pura emoção e felicidade. Sucesso até a chegada em Ribeirão Preto, onde tenhho grandes amigos. Um dia a gente se cruza por essas estradas.
    Fraterno motoabraço - Renato Lopes - Santa Maria - RS

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  4. Olá Lucio e Paula!que aventura hein!?!ainda bem que rio estava seco!hehehe...

    Báh Tchê!graças a Deus vc's conseguiram passar por mais esse desafio...estou praticamente viajando com vc's...até mais!

    Grande Abraço...!

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  5. Que perrengue! Mas o que seria uma grande aventura de moto sem contos como esse? Parabéns pela união do casal, que nesses momentos, é fundamental! Obrigado por compartilhar, estamos viajando com vcs.

    Grande abraço!

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  6. Ave Maria... É, Renato Lopes (acima), e eu achando que viajar de Belo Horizonte/MG à Santa Maria/RS era aventura...

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  7. UFA ! Quando acabei de ler o relato... voltei a respirar tranquilo. Força amigos. E eu que até achei que minha segunda-feira tinha sido dificil. Grande abraço, REINALDO - RS

    WWW.HOGPOA.BLOGSPOT.COM

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  8. Muito obrigado a todos pelas palavras de incentivo.
    Esse trecho trouxe, com certeza, situações inesperadas.
    Mas, a vida sempre nos traz situações inesperadas.
    Confesso que foi duro e tive meus momentos de medo.
    Vamos seguindo e buscando soluções para os desafios.......sempre.
    Grande abraço a todos.

    Lúcio & Maria Paula

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  9. ola
    achei seu site quando procurava informações sobre como atravessar da Colombia para o Panamá, em novembro de 2011 estou partindo de Guarulhos a EUA, a idéia é após passar América Central chegando no México ir em direção a Tijuana, depois em solo Americano Los Angeles e Las Vegas, e cruzar o EUA em direção ao Atlantico, por pedaços da Route 66 até Atlanta, Menphis e Miami, voltando pelo México passando por Cancum e retornando a América central e cruzar novamente o Canal do Panama. Minha pergunta, vc possui site ou contatos para realizar a travessia do canal, a idéia é na ida usar os veleiros e na volta o avião. Li no seu blog que vc usou uma rota que poucos conhecem na vinda do Panama a Colombia. Poderia me ajudar com algumas informações? Segue o link do meu blog e aguardo sua visita por aqui.
    http://expedicaopelaamericalatina.blogspot.com/

    caso permita, tenho a opção de links no meu blog e gostaria de adicionar o seu para consulta de novos viajantes.

    saudações

    Marcelo santos
    MC BR-116

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